Você é uma pessoal literal?
Pessoa literal é a com tendência de pegar as coisas muito ao pé da
letra. Isso é normal até certo ponto nas crianças. O que dizemos para elas é
recebido por elas como verdade e literal. E num adulto? O que pode ser bom ou
ruim funcionar muito literalmente?
Anos atrás vi um livro numa livraria e lamento não tê-lo comprado
porque nunca mais vi esse livro. Era literatura infantil e o(a) autor(a) foi
muito criativo(a). Havia desenhos que tentavam expressar o que seria a
imaginação da criança quando ela escuta uma frase como “chover canivetes”,
“pagar o pato”, “tá russo!”, etc. Por exemplo, na página do livro com a frase
“pagar o pato”, que sabemos significar, em gíria, a pessoa ter que arcar com as
consequências de suas atitudes ou escolhas, havia uma mão dando dinheiro a um
pato. Na página da frase “chover canivetes” havia o desenho de canivetes caindo
do céu.
A criança e as outras pessoas muito literais recebem assim o que
lhe é dito, com literalidade, ao pé da letra. Na criança isso é normal porque
ela não sabe entender a subjetividade das coisas, e por isso pega muito
objetivamente o que lhe é dito. Aliás, é muito importante nunca mentir para uma
criança, o que não é o mesmo que ter que dizer toda a verdade. Por exemplo,
algo que parece besteira, e que pode marcar negativamente a mente da criança, é
a mãe estando ocupada em casa e o filhinho de 6 anos atender o telefone que é
para ela, ela dizer ao filho para dar o recado: “Ah! Mamãe está muito ocupada
agora! Diga que não estou!” Essa mentira confunde a criança, normalmente
honesta, pura, sem maldade. E perturba a confiança dela na mãe ou pai que
mente.
O adulto literal e a criança demasiadamente literal, podem ser
pessoas que não conseguiram ainda flexibilizar as comunicações sociais. Podem
ser vítimas de pais exigentes, severos, perfeccionistas, racionais, que não dão
espaço para a afetividade, que é o recheio das relações humanas. Em
relacionamentos com falta desse recheio, o que sobra é a literalidade. Ou seja,
uma conclusão da realidade à partir de uma mente mais rígida, menos flexível,
literal.
Ser literal é viver pela letra da lei e isso pode ser exigente não
só para as outras pessoas que convivem com o indivíduo literal, mas para ele
mesmo, porque falta o “óleo” ou a “graxa amaciante” da incorporação das emoções
na vida social. Por isso é que as pessoas legalistas são duras em seus contatos
com os outros, e com certeza consigo mesmas.
A pessoa literal precisa ser ajudada a flexionar, reduzir a
cobrança interna, praticar a misericórdia consigo e com os outros. Nas suas
declarações talvez ela pegue pesado, e mesmo ao dizer algo verdadeiro ela pode
ser dura, como que atacando. Geralmente ela não quer ser assim, mas
acostumou-se desse jeito e pode ser que demore a perceber seu jeito de ser
literal, rígido e duro nas relações humanas e, repito, consigo mesma.
Não é uma questão de culpa, ou seja, não adianta culpar-se, se
você é assim, ou culpar uma pessoa assim por ela ser literal. Ela se tornou
assim por alguma necessidade possivelmente desde a infância. Se ela viveu num
ambiente familiar “perfeccionista”, com uma mãe ou pai com mania de limpeza e
arrumação, em que nada estava fora de ordem, ela pode ter aprendido que
precisava ser “certa”, e isso pode significar ser literal porque ela teria que
viver dentro da letra da lei, sem nenhum espaço para expressar emoção, seja de
zanga, de discordância, ou de prazer, porque emoções geralmente ameaçam as
pessoas literais e podem incomodar as perfeccionistas. Elas não sabem lidar bem
com sentimentos, mas sabem lidar muito bem com pensamentos, ordens, regras.
Descubra se você é literal, pensando no que você mais pensa
(conteúdo), na maneira como você pensa (forma) e funciona no seu relacionamento
consigo mesmo e com os outros (atitude). Se perceber que dá explicações demais,
dá muitos detalhes, se sente fechado(a) para expressar afeto, acha que os
comentários são contra você, pega a coisa muito pesado, muito ao pé da letra,
talvez seja hora de flexibilizar, relevar, aliviar a pressão consigo mesmo,
relaxar, deixar que as pessoas se virem também sem você ter que estar sendo
detalhista e perfeito(a) para que elas não se irritem, ou cobrem coisas de
você. Deixe que elas assumam suas próprias (delas) reações emocionais, sem você
ter que ser literal para “salvá-las”.
Fonte: Dr. César Vasconcellos
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